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Entrevista- Alexandra Moraes (O Pintinho)


O personagem da jornalista Alexandra Moraes ultrapassa os limites da internet e ganha o mercado editorial

 

Criada pela jornalista Alexandra Moraes, com diálogos cheios de sarcasmo e de um humor ácido, a série de tirinhas ‘O Pintinho’ explodiu na internet e ganhou as páginas dos livros.

A paulistana Alexandra iniciou este projeto em 2009, passando a fazer parte do seleto e ainda restrito grupo de mulheres que produzem quadrinhos. No ano seguinte, reuniu todo o material em um Tumblr e ganhou a internet. Hoje a fanpage de ‘O Pintinho’ no Facebook conta com cerca de 50 mil seguidores.

A série foi inspirada no nascimento do primeiro filho de Alexandra e nas projeções de conversas que ela poderia ter com ele um dia. Ao expor situações cotidianas nas quais muita gente se identifica, as tirinhas de ‘O Pintinho’ se tornaram referências, sobretudo para mães fãs de quadrinhos e cultura pop.

Em entrevista ao Capitão Nada, além de tratar de questões criativas e outros assuntos relacionados ao feminismo, Alexandra Moraes se diz grata por isso, mas, para ela, o papel das tiras e dos quadrinhos ainda é o de sempre – fazer rir.

Capitão Nada - Em entrevista para a revista TPM, você disse que a primeira tirinha você desenhou foi sobre uma mãe. Tocar em temáticas que tratam o universo feminino sempre esteve presente em seus processos criativos?

Alexandra Morares - Não sei se o “universo feminino” esteve sempre nos meus processos criativos, mas com certeza esteve sempre em mim, porque é um dos mundos do qual, querendo ou não, faço parte. Mas foram várias direções que tentei explorar e acabou que foi a partir dessa tirinha de uma mãe um pouco desesperada, mas não exasperada, é que eu consegui desenvolver alguma coisa. Porque eu era um pouco isso e me afligia com isso.

CN - Depois do nascimento do seu filho Benjamin, você criou o personagem ‘O Pintinho’, que discute os dilemas da maternidade. Qual a importância das tiras enquanto ferramenta de empoderamento da mulher?

AM - Acho que qualquer ferramenta pode servir pra empoderamento na mesma medida em que pode servir para depreciação. Seja tirinha, furadeira, sutiã, fralda etc. Não gosto muito da palavra ‘empoderamento’, mas entendo que ela reflete uma ideia importante sobretudo de valorização.

CN - Como é tratar um assunto de tanta importância em um dos maiores jornais do Brasil, que é a Folha de S. Paulo?

AM - Hoje só público ocasionalmente, talvez justamente por acreditar que não tenho nada lá muito importante para dizer. Mas, no geral, publicar no jornal é um salto no escuro, no sentido de não ter a reação instantânea da rede, que é, ao mesmo tempo, bem maior e de um outro público. O jornal contempla um perfil um pouco menos plural.

CN - Qual sua opinião sobre a falta de representatividade feminina em prêmios como HQ Mix, no Brasil, e no Angoulême, na França?

AM - Acho que há mudanças e que elas estão em pleno curso, mas talvez seja preciso ter um pouco de paciência.

CN - Com o advento da internet, o que a popularização do consumo e da produção de quadrinhos e tirinhas proporcionou para os artistas de produção independente?

AM - Tudo isso serviu como combustível pra bombar a criação recente, mais gente produzindo e mais gente consumindo, sendo que parte dessa gente que consome passa a produzir etc. É um ciclo virtuoso.

CN - Qual a sua opinião quanto a leis de incentivos culturais como a lei Rouanet e o sistema de vaquinhas coletivas via internet, o crowdfunding. Como é sobreviver de arte?

AM - Não sei, viu… Eu trabalho em tempo integral em outra atividade, que é o jornalismo. As vaquinhas são uma boa oportunidade para financiar muita coisa legal, que de outra maneira não ganharia vida. Sou a favor.

CN - O cotidiano é algo que costuma inspirar autoras e autores. Na segunda edição de ´O Pintinho’, intitulada ‘Para sempre classe média’, a crise e os conflitos que ali se desenrolam entre as personagens, são baseados na classe ‘mais vilipendiada do Face’. Como é o processo de “globalizar” situações pessoais e transmitir uma mensagem para as leitoras e leitores?

AM - O convívio virtual ajuda a jogar luz sobre determinadas coisas que antes ficavam escondidas do dia a dia. O bom é saber que não estamos sofrendo sozinhos. Melhor ainda saber que não somos os únicos a sofrer por motivos cretinos!

CN - Como você aproveita o relacionamento direto com o público por meio das redes sociais?

AM - Existe uma identificação às vezes imediata, quase sempre carinhosa. Gosto especialmente quando vejo pais marcando filhos e vice-versa. As histórias ganham uma nova dimensão: são desgracinhas do dia a dia promovidas a uma versão mais humilde da catarse.

CN - Os xingamentos contra Dilma, o ministério só de homens, o caso do estupro coletivo no Rio de Janeiro.... Diante desse cenário que, apesar da luta e das conquistas já realizadas, ainda é nocivo às mulheres no Brasil, como fazer das tirinhas e quadrinhos ferramentas de desenvolvimento social?

AM - Eu pessoalmente espero mais de outros setores do que das tirinhas. Acho que os quadrinhos podem sensibilizar e/ou fazer rir. Isso já é muito, num mundo que é, sempre foi e, perdão pelo pessimismo, talvez continue a ser, bruto e sem graça. Até o fim dos tempos.

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